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Foto do escritorIasmine Pereira

Estamos reclusos. E agora?

"Nada do que foi será. De novo do jeito que já foi um dia".


Talvez essa frase, pensada há tantos anos, hoje faça mais sentido do que nunca. Vivemos momentos de mudanças, de incertezas, instabilidade e lidamos com o novo todo tempo. Nós que somos seres do comodismo, da zona de conforto e do nosso lugar originário.


Já não reconhecemos nosso habitat, aquela casa que nos abriga, que acolhe e recebe nosso eu, como natural. Para muitos, ela é lugar inóspito quando vem a obrigação de ali estar. E a gente não gosta de ser obrigado, logo nós, seres da escolha. Já dizia aquela sabida expressão popular dos últimos tempos; os memes falam por nós: "não sou obrigado(a) a nada", mas sim, somos.


O lugar de conforto vira algo incômodo, a ideia de parar assusta, a cabeça desorganiza e partimos pra faxina, seja ela mental ou física. Buscamos sedação, anestesia, maratonamos séries, adentramos no universo da literatura, retomamos velhos hábitos, e negamos.


Ahhh, como negamos! De tantas formas, que fica até difícil descrever. Negamos a importância de nos mantermos em isolamento, a taxa de contágio, as medidas de higienização, a falta de infraestrutura do nosso sistema de saúde, os problemas que virão, os boletos, a nossa incapacidade…


Faz parte do nosso psiquismo e tem nome isso, como gosto de falar no consultório. Bem vindo, mecanismo de defesa. A negação faz a gente "dar conta" do impossível. E se por algum motivo fica difícil entender o que é isso, procure, na segunda temporada de This Is Us (spoiler - de leve - alert), o episódio em que Rebecca recebe a notícia do falecimento de Jack.

É custoso não saber por quanto tempo esse recolhimento vai durar, como será o amanhã e o que será preciso fazer. Reinventar-se. Fica esse conceito por aqui. Estamos em um momento que precisamos fazer diferente, agir de outra forma, descobrir novos - antigos - gozos, como a psicanálise gosta tanto de pontuar.

Descemos do transporte rumo ao exterior e agora fazemos o caminho reverso. Estamos, isolados (ou não) com o nosso verdadeiro eu; estamos reclusos. Logo nós, que fomos acostumados a curar dor de cotovelo num bar, com os amigos, batendo a raba no chão ou comendo tudo aquilo que achamos no mercado. Nós, seres do externo estamos sendo obrigados a olhar pra dentro; a ficar em casa; com o nosso psiquismo, com as nossas angústias, imperfeições e também qualidades. Temos agora, em nossas mãos, a possibilidade de ser diferente do que já fomos um dia.


A ansiedade gerada pelo momento em que vivemos é desestabilizante, as notícias não ajudam e muita gente não tá acostumada a ter que lidar consigo mesmo. A casa, seja física ou emocional, não está dando conta de tanta coisa que vem por aí. É normal. Ficar desestabilizado nesse período faz sentido e sinaliza que você está agindo conforme a realidade externa - instável. Mas evitemos as fantasias catastróficas, as teorias das conspirações e o excesso de informação. De acordo com a OMS (Organização Mundial de Saúde) e os Médicos sem Fronteiras, o indicado nesses períodos de epidemias e/ou pandemias é acessar informações do noticiário apenas duas vezes por dia. Sim. Você está autorizado a ficar por 8h seguidas sem ver ou ler jornal.


Esse é um momento que propicia a reflexão, que dá luz às angústias, que faz o peito transbordar. Quem de fato resolver apostar nesse período para olhar nas profundezas, uma coisa eu garanto, é impossível sair dessa igual.

Termino como comecei, afirmando mais uma vez: "nada do que foi será, igual ou do jeito que já foi um dia".


P.S.: E pra quem precisar de apoio, meu consultório online está de chat aberto. Já que jabá é bom e o profissional liberal precisa. Divulguem!


Um salve a todos, já que abraços foram suspensos, né...



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